segunda-feira, 16 de novembro de 2009

MUITAS VEZES

Muitas vezes passa pela minha cabeça a canseira que dá ser pai babá. Pegar o Lorenzo na escolinha e chegar com ele em casa. Agora que ele tirou as fraldas, serviço em dobro. Perguntar toda hora se ele quer mijar. Se quer fazer cocô. Se quer comer. O quer comer. Mais suco. Troca cueca. Limpa a bunda. Limpa o xixi do chão. Assisto pela milésima vez, nem que seja apenas ouvindo, um dos filmes da trilogia da Era do Gelo. Do Jurrasic Park. Carros. Charlie e Lola. King Kong. Confesso que gosto quando assisto Van Helsing de novo.

Muitas vezes me passa pela cabeça o tempo em que não estou mais com meus amigos em uma mesa de bar, mesmo que muitos deles não frequentem mais os mesmos bares. Que estejam na mesma situação que eu. Que tenham virado velhos. Que tenham virado paus mandados das mulheres. Que, azar deles, não tenham uma Betine. Estou aqui e não lá. No furdunço. Na noite. Na perdição das mesas de bares, dos idiotas, das garotas fáceis e dos garçons que gostam de mim, do meu dinheiro e da minha cara de zonzo.

Muitas vezes fico no trabalho, me quebrando. Aguentando a mesma burocracia de sempre. Os mesmos programas pega-ratão do governo. Os clientes reclamando sempre. Sempre as mesmas perguntas. Sempre as mesmas respostas. Sempre o mesmo dinheiro indo pela mesma vala suja do dinheiro público. O cansaço de repetir, repetir e somar, multiplicar. Robô da contabilidade. A imaginação é algo que não preciso utilizar no trabalho. Aquilo lá já é surrealismo demais pra minha cabeça. Pra qualquer cabeça.

Muitas vezes penso no tempo em que não estou escrevendo. No cansaço que sinto quando fico só, e é necessário ficar só. Algumas horas por dia. Poucas, que seja. Todo mundo precisa de solidão na medida certa. Eu preciso. Escrever me alimenta a solidão. E a solidão alimenta minha imaginação tanto quanto a falta dela. A solidão não é triste. Só sente solidão quem é ou já foi feliz. Desconfie sempre de quem é feliz o tempo todo. De quem sorri cheio de dentes. Prefiro os que não cumprimentam dos que dão falsos bondias. E essa solidão, esse tempo, eu acelero com uma ou duas cervejas, como agora, um Lou Reed sem muita bagunça pra me acompanhar. "Hey honey. Take a walk on the wild side." Deixar os devaneios fluírem soltos. Voltar ao meu mundo. meu mundo jurássico onde eu mando e desmando. Minha literatura presa dentro dela mesmo. Livre de todas as outras. Respirando pelas narinas da alma. Mandando um foda-se gigante para o resto do mundo.

Muitas vezes me pego brabo pela Betine trabalhar até tarde. Por não estar aqui comigo. Limpar a bunda do Lorenzo. Limpar o chão. Fazer uma comida. Lavar louça. Mesmo que quando ela chegue a gente brigue pela TV, pelo computador ou até pelo banheiro. Mesmo que muitas vezes nas férias a gente quase se mate. Que outras a gente quase se mate depois de algumas. Mesmo que não exista mais o "nós dois" livres e sim o nós mais Lorenzo. Que quando ela chega e ainda estou acordado, não estou bem acordado. E se estou acordado, estou quebrado. Então, só então, deitamos. E dormimos.

Muitas vezes me pego como hoje. Coloco um curta-metragem, Bunny, que tem como extra do primeiro DVD da Era do Gelo e o Lorenzo resmunga no começo. É a história de um coelho velho e solitário que se irrita quando prepara uma receita de bolo e é atraplhado por uma mosca da luz. E quando a história vai chegando ao fim, o Çorenzo vai começando a roncar baixinho, de olhos abertos. E aos poucos os olhos fecham. Fecham quase juntos com a voz do Tom Waits entrando nos créditos. A voz soturna e cavernosa do Tom Waits ninando o Lorenzo. Ele arria o joelho. A cabeça pende prum lado. Ele se aconchega no braço da poltrona e adormece.

Muitas vezes, todas as vezes, eu não me arrependo de nada quando a cena acima se repete. Pois nada, nem muito e nem pouco, se iguala a observar o Lorenzo adormecendo, calmo, tranquilo, navegando pelo mundo dos sonhos. Quem me dera um dia participar de um dos sonhos dele. Talvez eu participe, e nem saiba, no meu sonho. Talvez realmente a paternidade seja sonhar de olhos abertos, mesmo que mareados de cerveja, como agora, depois que ele dormiu. Esta cerveja é apenas um complemento. O Lorenzo já me tira a sobriedade. Durma com os anjos, minha mãe me dizia quando criança. Sim, nessa época de vampiros e dinossauros, talvez ainda existam os anjos das crianças de antigamente. Quando as crianças dormem, escuto um barulho de água. Os anjos levantam a túnica que todo anjo de carteirinha tem, arriam os joelhos e colocam os pés de molho em uma bacia de água morna. Eles também tem seus anjos. Que vivem na minha cerveja. Daqui eu cuido deles.

sexta-feira, 19 de junho de 2009

O Lorenzo Quieto

O Lorenzo chegou da escola e pediu pra colocar do Charlie e Lola e sentou, tirou as meias, já coloquei de volta, quer dizer, o Monstro da Gripe (eu inventei) colocou de volta, e tá lá, no sofá, pernas cruzadas, tão quieto, tão civilizado, que me deixou um tempo livre para voltar a escrever aqui no blog.

Afinal, acham vocês, meus parcos leitores, que é barbada ser escritor perto do Lorenzo? Não. O tempo que me sobrava depois do meu ganha-pão no escritório eu gasto, com muito gosto, com o Lorenzo. Jogar bola na sala, brincar de carrinho, de pular na cama, abrir pacotes de bolachas, fazer comidas (na verdade esquentar as que os outros fizeram), sanduíches, trocar fraldas, dar banho, limpar cara, limpar mãos, limpar chão, brigar com ele, discutir com ele, assistir o jogo de futebol (ele reclama no começo, mas assiste), assistir filmes de ação, corridas de carros e de monstros (ele é fissurado no King Kong, principalmente na parte em que ele torce pro dinossauro, afinal, o amigo da menina - a Naomi Watts - é o dinossauro, que o Lo chama de Dinossauro Rex) juntos. Ufa!

Depois disso tudo, meu segundo expediente, quando o Lorenzo resolve capotar, meu eufemismo para dormir, penso em retomar o romance, dois, na verdade, que iniciei em dezembro, um, e em 2007, o outro. Um é tão distante do outro. Um é sobre álcool, drogas, sexo sem amor, amor sem sexo e Lancheria do Parque. Na verdade é sobre outro assunto, mas essa eu não respondo, por enquanto. O outro é sobre paternidade e sobre paixão e sobre romance. O Lorenzo. Ah, o Lorenzo. Pensei eu que não viria aqui escrever coisas bobas, mas estou apaixonado pelo momento da vida que vivo. Com pouco dinheiro na conta. Pagando juros no cartão. Trabalhando sem descanso (e nem faço questão de férias). Mas sempre tem o Lorenzo. Um pouco de vinhos nas sextas. Um jogo do Inter uma ou duas vezes por mês.

É tão bom que me dá vontade de namorar de novo. Mas a Betine chega cansada. E eu já tô destruído. Sobrar tempo pra assistir um filme, qualquer, abraçados, uma bebida pra aquecer, comentários bobos, sem conversa de escola, de dinheiro, dos outros, de ninguém, simplesmente bobagens. Sim, claro que quando namoramos, namorávamos, sem Lorenzo, era outra coisa. Outra vida. Que vive dentro de nós. Uma vida não exclui a outra. Somente o cansaço as separa.

E nós sabemos disso.

Ps.: Era para escrever sobre o Lorenzo aqui? Mas sem a Betine, não existiria Lorenzo. Me deu até vontade de não ter nascido assim. Tão cínico. Sentimentos que só um Lorenzo quieto deixam aflorar.

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Imaginação

Agora que se aproxima do momento do Lorenzo começar a frequentar a escolinha, bate uma saudade. Saudade do tempo em que convivemos aqui, 6 horas por noite. Brincando. Brigando. Discutindo. Repetindo frases desconexas e inventando um vocabulário doido que só nós dois entendemos, mesmo sem entendermos nada.

Bligblogtunctum póquedizquetóin chuquetuqueluquemoncxs niquetiquebi.

Sacaram?

Essa é a nossa conversa.

Ele assiste Discovery Kids comigo, mas muitas vezes trocamos de canal e olhamos uns filmes de ação. Desses que tem dinossauros, perseguições de automóveis ou montros tipo o Hell Boy.
Ele gosta dessas coisas.
Eu nunca deixei de gostar.
Outras vezes eu assisto futebol e ele olha, brinca, olha, brinca, faz cocô, brinca.
E a noite se perde até que a Betine chega frenética da redação do orDinário Gaúcho.
Vida la vida loca!

Mas em março o Lo vai começar a ir na escolinha. Vai acordar mais cedo. Vai, certamente, dormir mais cedo. Sim, a Cris, a babá-mor, a qual o Lo apelidou de "vassourinha" e sabe-se lá daonde ele cismou com esse apelido, vai acordá-lo. Ele vai se cansar mais cedo e certamente dormir bem mais cedo.

Eu terei meu tempo livre.

Poderei voltar a escrever enlouquecidamente.

Mas meu parceirinho vai dormir cedo. Bateremos menos papos. Brincaremos menos. Talvez eu perca os episódios da nova temporada dos Backyardigans ou dos Jakers. Será um pouco menos barulhento.

A liberdade sempre tem um preço.

Mas, nos findis, poderemos passear de dia no inverno.

Sim, tudo tem uma compensação.

Assim como pai que é pai sempre tem imaginação.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Cerveja & Fralda

Enquanto escrevo um romance chamado singelamente de Cerveja & Fralda, vocês podem acompanhar as peripécias de Lorenzo, o pestinha da foto, e muitos outros assuntos de pai pra filho.

Ou de cerveja pra fralda.

Como queiram.

Ah, sim.

O barbudo sou eu.

Até amanhã!

MB